Uma ‘rapidinha’ com Pablo Picasso

 

 

 

 

Pablo Picasso, espanhol, nascido em Málaga, em 25 de outubro de 1881.

Considerado um “revolucionário, genial, vanguardista, visionário”, deu novos rumos à arte do século vinte.

 

A entrevista foi concedida na última residência do artista, em Notre-Dane-de-Vie, no sul da França.

 

 

 

PICASSO E EV  cópia

 

 

 

Eliane Velozo – Pablo, você foi criado entre mulheres. Moravam na sua casa, durante sua infância: seu pai, professor de arte, mas um tanto ausente das atividades familiares, sua mãe, duas irmãs, duas tias e a babá.

Isso foi determinante para você?

 

Pablo Picasso – Foi sim. Eu carreguei por toda a minha vida a imagem marcante de todas essas mulheres. E, também, de todas as outras que passaram por minha vida. Elas estão em minhas obras, dos desenhos às pinturas, e nas esculturas também.

 

EV – Você tem olho de vencedor.  Segundo sua mãe, sua primeira palavra foi “lápis”. Ela também falou que “você nasceu para a glória”. Esse seu olho observador, essa fascinação, surgida nos seus primeiros anos de vida, levou-o a refletir, analisar, alguma vez, sua trajetória artística?

 

PP – Não, para mim tudo era natural. Na infância eu desenhava tudo que via pela frente. Aos oito anos desenhei a cena de uma tourada. Aos 13, pintei a minha primeira paixão, uma senhorinha linda, que eu acreditava que fosse um anjo. Aos 14 anos, recém chegado a Barcelona, vindo de Málaga, passei nos exames para a Escola de Belas Artes de Barcelona. Daí em diante, nunca mais parei de exercer minha arte. Acredito que sempre relacionei minha vida e meu fazer artístico, às mulheres que me cercaram… na minha “fase azul”, mais depressiva, na “fase rosa”, onde uma nova mulher me deu novos alentos, e quando resolvi ver várias mulheres em uma só imagem, ou várias imagens de uma mesma mulher, ao mesmo tempo, ou as mulheres como o supra sumo do ser observador, com olhos direcionados para todos os lados, na minha obra cubista. Esse processo também teve relação direta com minhas observações das máscaras africanas, que são, para mim, de alguma forma,  experiências cubistas.

 

Na minha obra cubista, desejei, também, retirar toda a possibilidade de realismo que vinha sendo trazido pela fotografia e pelo cinema.

 

EV – Você viveu uma fase bastante conturbada da história mundial e européia, a primeira guerra mundial, a guerra civil espanhola, e a segunda guerra mundial. O que significaram essas sequencias de conflitos violentos na sua produção artística?

 

PP – Antes de me mudar para Barcelona, que era um centro de industrialização e de lutas sociais, eu vivia em um mundo aparentemente pacato. Ao observar tudo que me cercava na realidade de Barcelona, eu me transformei profundamente. Passei a acreditar em uma sociedade mais justa. Nessas mesma época o valor de minha obra foi reconhecido artística e financeiramente.

 

Após a II Guerra Mundial, eu entrei para o partido comunista, e lá permaneci por toda a minha vida.

 

EV – Muitos artistas, a partir da década de vinte, mudavam-se para Paris, buscando tornarem-se conhecidos. São declarações sobre Paris: March Chagal –  “Se eu não tivesse vindo para Paris, não seria quem sou”; Juan Miró – “Nós todos fomos para Paris, era nosso objetivo. Se nos saíssemos bem em Paris, todas as portas se abriam para nós”; Ernest Hemingway – “Paris valia sempre a pena”; Gertrud Sten – “Paris era onde o século XX estava. Era onde tínhamos que estar”.

 

Todos esses artistas, me parece, viviam uma crise de identidade. O que você tem a dizer sobre Paris?

 

PP – Paris foi fundamental. Nessa época existia um pessimismo geral. Tínhamos dificuldade de adequação social, questionávamos nossa existência e nosso mundo. Era difícil vender nossa arte…

 

Gertrud Stein foi nossa mecenas. Ela colecionava o trabalho de todos nós. De alguma forma ela nos relacionava uns aos outros, e nos fortalecia. Nossas obras eram compradas por cerca de cem, duzentos dólares. Mas ela era quem nos valorizava. Ela sabia o que estava fazendo. Vivíamos muito ao redor dela.

 

Aquele foi, sem sombra de dúvidas, um tempo muito rico para a arte.

 

EV – Você foi assíduo freqüentador das touradas. O que lhe atraia nelas?

 

PP – Talvez o contraponto entre amor e morte, entre sofrimento e glória. O toureiro, para mim, era  um herói, traduzido pela beleza e pela magia visual de seus movimentos na arena. Isso entrava em meu sangue, em minha alma. Parecia comigo… aquela figura imponente, ali, na frente do touro era como um rei. Eu também pensava, algumas vezes, na improvável vitória do touro. Talvez até desejei que o touro saísse, em algum momento, vencedor. Acho que isso foi acontecendo à medida que a consciência social crescia em mim.

 

Mas era, para mim, sobretudo, uma experiência estética, trágica e marcante, que acredito desembocava no meu trabalho.

 

EV – Guernica, de 1937, é um supra sumo de sua obra revolucionária. E você ainda nem imaginava os horrores da segunda grande guerra que estava por vir. Nessa época o mundo via a ascensão do nazi-fascismo.

 

A Guernica é praticamente uma colagem… uma terrível e realística colagem das consequencias da guerra. Hoje, é uma das obras de arte mais vistas do mundo.

O que é a Guernica para Pabrlo Picasso?

 

PP –  É todo meu desejo de expandir, ao máximo, o imaginário dos resultados trágicos do mundo que o ser humano estava construindo, e destruindo… é um pouco dessa contradição de desconstrução da realidade, da reconstrução de uma outra realidade fragmentada, partida em mil facetas, transfigurada pela ausência de perspectiva, na obra, como na sociedade, igualzinho à sociedade como eu a ví. É um grito pessimista sobre o porvir.

 

EV – Muito obrigada. Foi um imensurável prazer lhe conhecer.

 

 

(Texto de ficção. As informações nas perguntas são baseadas em fatos históricos. As respostas, mais subjetivas, são ficção, respostas possíveis, baseadas no que se conhece sobre o artista e nas opiniões da autora da entrevista).