Parecia loucura encontrá-lo, mas após vários meses de mensagens em sites de relacionamento da rede mundial de computadores, chega-me a mensagem: sou eu, estou vivo.
Como saber se ele era ele mesmo?
Fiz uma pergunta “secreta”: o que disseste ao dono do Tejo Bar, em Lisboa, no primeiro momento em que o viste?
Ao que ele respondeu: Are you able to ask me in English? (Podes fazer a pergunta em inglês?)
Depois, ele me respondeu à pergunta, com todas as letas, não tive dúvidas de que ele era ele, e o convidei a vir ao Recife.
Chegada ao Recife e hospedagem acertados.
Fui esperá-lo no aeroporto Internacional Gilberto Freyre.
Já na chegada teve uma surpresa:
– Amazing! Quanta mulher bonita! Elas perderam as roupas?
Não sei exatamente o que ele queria perguntar, mas foi isso que falou.
Que nada! – explicava eu, em inglês.
Levei-o para o hotel. Recomendei os itens indispensáveis ao café da manhã do dia seguinte: frutas, queijos, massas, e muito, muito líquido. Entreguei-lhe um cantil que seria por ele carregado durante todo o dia seguinte.
– Try to sleep well, Scott, porque amanhã a barra vai ser pesada
– Ok, ok, thanks.
Não expliquei nada sobre o que ele veria no outro dia. Achei que o elemento surpresa seria uma experiência fantástica.
Logo às nove da manhã do sábado, lá fomos nós, em direção ao local de saída do bloco.
O calor de rachar beirava os 35º C, e não havia uma única nuvem no céu apaziguando o sol.
Scott, já estava assustado, pois sempre viveu em cidade pequena, e tinha experimentado o maior aglomerado humano num certo 4 de Julho, em que todas as cinco mil almas residentes em sua cidade festejavam em frente à igreja.
Estava quase sem roupa… Seu suor escorria mais que bica em dia de tempestade.
– Pôrra meu! What is this?
Suas palavras em bom português eram fruto de aulas com um brasileiro, entre o dia do convite e sua viagem.
– Estoouu impressionnaaddo!
Exótico, físico esbelto, olhos atraentes, cabelo longo e espichado o destoavam da fantástica mistura racial pernambucana.
Lindas garotas, quase nuas, ofereciam-lhe beijinhos e abraços. Coisa nunca vista por ele!
Tímido, ficava vermelho como camarão assado.
– Elas querem make love with me?
– Não Scott, é só carnaval!
Essa palavra que ele entendia sem entender. Não tinha a menor noção do funcionamento de toda aquela loucura:
vinte e cinco trios- elétricos, tocando frevos variados, passariam por nós, cada um com música mais frenética que outra…
Também passram por nós quatro orquestras de frevo, ali, no chão mesmo, tocando desesperadamente, com a multidão pulando como pipoca na panela, na frente, dos lados, atrás.
Os pernambucanos, ao ouvirem um frevo, não aguentam ficar sem levantar os braços e tirar os dois pés do chão, de preferência tudo ao mesmo tempo.
Ele, aficionado à música erudita, ficava confuso com aquela mecânica… e com o povo.
Tudo deslumbrante!
Ele mexia o bumbum para um lado e para outro, e quando aguentava o calor, levantava os braços e dizia “amazing!, isto é bom, I love it”.
E eu amava ele fazendo isso!
Chegou a passar mal, e foi acudido por cinco lindas loiras que lhe deram água gelada e beijinhos na boca.
Beijos que ele achou estranhos mas não falou nada. Afinal, falava mesmo muito pouco.
Nem imaginou que eram todos homens vestidos de lindas garotas, de saias curtas e bocas vermelhas de batom.
A certa altura deitou-se no chão e falou:
– I am dying!
– Não, Scott, disso você não morre!
Ele sobreviveu, e somente desmaiou horas depois, quando lhe falei que havia, no Galo da Madrugada, 1,5 milhão de foliões. Mas ressuscitou perguntando:
– Estou vivo? Dead? This é real?
Para dirimir suas dúvidas, eu e minha colorida sombrinha de frevo, resolvemos fazer aqui o registro desse dia único, imperdível, inominável.
Gostaria de ter misturado minhas gordurinhas aos ossos mal cobertos dele… Confundir ainda mais nossos enigmas… Porém era carnaval, a quarta-feira ingrata já já chegaria, e… não deu tempo, pois nos perdemos, e estou novamente à sua procura.